A saúde pública brasileira hoje está colocada à
prova pelos diversos entraves que a política econômica e social enfrenta. Nesse
desalento, a população adoece não apenas pela falta explícita de saúde, mas
também pelo fato de não ter acesso aos meios de promoção em saúde, educação e
bem-estar.
Esse estudo tem como objetivo provocar discussões
sobre a educação em enfermagem, visualizando o contexto das Diretrizes
Curriculares do Curso de Graduação em Enfermagem com ênfase na atual política
social e econômica, onde a abordagem histórica propicia enfoques no tocante ao
Curso de Enfermagem oferecido no Brasil.
A formação da enfermagem moderna é estreitamente
influenciada pelas relações sociais, políticas, de educação e de saúde, que
culminam com as necessidades da sociedade brasileira.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos
de Graduação em Enfermagem (DCENF) foram oficialmente publicadas na Resolução
CNE/CES Nº 03 de 7 de novembro de 2001, delimitando elementos conceituais,
filosóficos e metodológicos que possam subsidiar o processo de educação em
Enfermagem, apontando estratégias de ensino e aprendizado, motivando uma nova
proposta para a formação dos enfermeiros.
O ensino superior de enfermagem no mundo
Nos séculos XII e XVI, sob exploração deliberada,
considerada um serviço doméstico, pela queda dos padrões morais que a
sustentava, a prática de enfermagem tornou-se indigna e sem atrativos para as
mulheres de casta social elevada. Esta fase tempestuosa, que significou uma
grave crise para a Enfermagem, permaneceu por muito tempo, e apenas no limiar
da revolução capitalista, é que alguns movimentos reformadores, que partiram
principalmente de iniciativas religiosas e sociais, tentam melhorar as
condições do pessoal a serviço dos hospitais. (COREN-RJ,2005)
No mundo moderno, as práticas de
saúde analisam as ações de saúde e, em especial, as de Enfermagem, sob a ótica
do sistema político-econômico da sociedade capitalista, ressaltando o
surgimento da Enfermagem como atividade profissional institucionalizada. Esta
análise inicia-se com a Revolução Industrial no século XVI e culmina com o
surgimento da Enfermagem moderna na Inglaterra, no século XIX.
Na Europa, em meados do século XIII, as Igrejas
Católica e Protestante juntamente com o Estado e, sobretudo, com o poderio da
classe dominante, cortaram da vida pública as pessoas que se envolviam com a
saúde da população. Os atores principais que podemos chamar de cuidadores eram
as mulheres. Essas tinham o papel de prestar cuidados básicos entre as
crianças, principalmente recém-nascidos, mulheres e idosos.Esse período foi marcado
pelo afastamento da mulher do exercício do poder na saúde que foram
transferidos para os técnicos e especialistas.
Ainda na Europa, podemos destacar como marco da
enfermagem mundial a reformista da saúde, a inglesa Florence Nightingale
(1820-1910). No Brasil, a enfermagem é referenciada pela baiana, Anna Justina
Nery, que prestou cuidados aos soldados brasileiros na Guerra do Paraguai
(1886-1870).
O ensino superior de enfermagem no Brasil
A Cruz Vermelha Brasileira foi organizada e
instalada no Brasil em fins de 1908, tendo como primeiro presidente Oswaldo
Cruz. Destacou-se por sua atuação durante a I Guerra Mundial (1914-1918),
fundadando-se filiais nos Estados. Durante a epidemia de gripe espanhola
(1918), colaborou na organização de postos de socorro, hospitalizando doentes e
enviando socorristas a diversas instituições hospitalares e a domicílio. Atuou
também socorrendo vítimas das inundações nos Estados de Sergipe e Bahia e das
secas do Nordeste. Muitas das socorristas dedicaram-se ativamente à formação de
voluntárias, continuando suas atividades após o término do conflito. (COREN-SP,
2005)
No desenvolvimento das organizações sanitárias no
Brasil, aparecem dois grandes médicos: Oswaldo Cruz, responsável pela criação
da Medicina Preventiva entre nós, e Carlos Chagas, pela sua contribuição à
Enfermagem em Saúde Pública. Em 2 de janeiro de 1920, pelo Decreto 3.987, foi
criado o Departamento Nacional de Saúde Pública. No setor de Profilaxia da
Tuberculose, iniciou-se o serviço de visitadores. No ano seguinte, pensou-se em
estender essa assistência ao setor de doenças venéreas e outras doenças
transmissíveis.
Por iniciativa de Carlos Chagas, então diretor do
Departamento, e com a cooperação da Fundação Rockfeller, chegou ao Rio, em
1921, um grupo de enfermeiras visitadoras que iniciou um curso intensivo.
Fundada a Escola Ana Néri, as primeiras alunas foram logo contratadas pelo
Departamento Nacional de Saúde Pública. Teve início então um trabalho de
educação sanitária nos setores de profilaxia da tuberculose e higiene infantil,
estendendo-se depois, à higiene pré-natal e visitação aos portadores de doenças
transmissíveis. (COREN-SP, 2005)
Considera-se que o ensino fundamental sistematizado
da Enfermagem Moderna no Brasil foi introduzido em 1923 pelo Decreto nº.
16300/23, no Rio de Janeiro, mediante a organização do Serviço de Enfermeiras
do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), então dirigida por Carlos
Chagas e posteriormente denominada Escola Ana Nery. (ITO, 2006)
No Brasil, até o início do século XX, a Enfermagem
brasileira era praticada por religiosas, vindas geralmente da Europa para se
ocupar dos doentes e preparar pessoal para exercer essa arte no país. O
paradigma da Enfermagem cristã enfatizava no desempenho profissional valores
relacionados a amor, abnegação e desprendimento, não valorizando a luta por
remuneração digna, condições ambientais de trabalho adequadas e inserção na
vida social e política. (LIMA, 1993)
Wanda de Aguiar Horta se destaca como a primeira
enfermeira brasileira que ousou escrever as bases de uma teoria para a
profissão. Em 1962, o ensino de enfermagem integra o sistema de ensino
universitário; criam-se cursos de mestrado e doutorado, que atualmente se
encontram em expansão. (LIMA, 1993)
Em todas as mudanças curriculares no ensino de
enfermagem no Brasil, denuncia-se a predominância do modelo médico/hospitalar
no ensino de graduação. A legislação sobre o ensino de enfermagem desde a
criação da Escola Anna Nery, compreendendo os currículos de 1923, 1949, 1962 e
1972, revelam que a formação do enfermeiro era centrada no pólo
indivíduo/doença/cura e na assistência hospitalar, seguindo o mercado de
trabalho especifico de cada época. (ITO, 2006)
As Diretrizes Curriculares definem ainda que a formação
do enfermeiro tem por objetivo dotar o profissional dos conhecimentos
requeridos para o exercício das seguintes competências e habilidades gerais:
atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança, administração e
gerenciamento e educação permanente. (ITO, 2006)
As Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos
de Graduação em Enfermagem (DCENF) tiveram uma materialidade concretizada a
partir de propostas que emergiram da mobilização das(os) enfermeiras(os),
através da sua associação de classe, de entidades educacionais e de setores da
sociedade civil interessados em defender as mudanças da formação na área da
saúde. Elas expressam os conceitos originários dos movimentos por mudanças na
educação em enfermagem, explicitando a necessidade do compromisso com
princípios da Reforma Sanitária Brasileira e do Sistema Único de Saúde (SUS).
(FERNANDES, 2005)
O grande desafio na formação do enfermeiro é
transpor o que é determinado pela nova Lei de Diretrizes e Bases e pelas Novas
Diretrizes Curriculares ao formar profissionais que superem o domínio
teórico-prático exigido pelo mercado de trabalho, enquanto agentes inovadores e
transformadores da realidade, inseridos e valorizados no mundo do trabalho.
(ITO, 2006)
Assim, as principais tendências de transformações
educacionais são: a desospitalização do processo ensino-aprendizagem; a
aprendizagem baseada em problemas e evidências; a aprendizagem direcionada para
a aquisição de competências cognitivas e tecnológicas em prevalência à
apreensão de aptidões específicas; a adoção da transdisciplinariedade; a
incorporação da avaliação econômica e da bioética nos currículos; e o estímulo
à investigação. (ITO, 2006)
O processo de formação de profissionais críticos,
reflexivos, com compromisso político e capazes de enfrentar os problemas
complexos que se apresentam na sociedade e, mais especificamente, na área da
saúde, pressupõe a utilização de metodologias ativas de ensino-aprendizagem,
que possibilitem aos estudantes ocuparem o lugar de sujeitos na construção da
sua aprendizagem, tendo o professor como facilitador e orientador. (FERNANDES,
2005)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A História da Enfermagem entre os séculos XVI e XIX
tem um perfil regrado a servidão e visto como um trabalho doméstico e
rudimentar. Na Inglaterra o trabalho da Enfermagem é institucionalizado,
denominando-se a Enfermagem Moderna que teve como precursora a inglesa Florence
Nightingale. No Brasil, a Enfermagem começa a sua História no início do século
XX, com a chegada de enfermeiras americanas com o objetivo de formar novas
profissionais pela então Escola de Saúde Pública que passou a ser
posteriormente denominada, Escola de Enfermagem Ana Nery, marco para a
enfermagem no Brasil.
Podemos observar claramente que os currículos de
Enfermagem ao longo do tempo foram transformados e adaptados de acordo com a
problemática apresentada no contexto da saúde pública brasileira e diante das
perspectivas político-econômicas vigente.
Inicialmente os currículos tinham uma estrutura
voltada para o modelo hospitalocêntrico, porém com advento das mudanças
sanitárias, onde o Sistema Único de Saúde – SUS, foi organizado de forma que
suas diretrizes estão voltadas para a prevenção e promoção da saúde, observamos
o crescimento de habilidades profissionais direcionadas para a saúde pública.
Mesmo tendo essa visão clara dessas mudanças que
são coerentes com as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de
graduação de Enfermagem, muitas instituições tendo autonomia para desenvolver
seus Projetos Políticos Pedagógicos, absorvem seus conteúdos no tocante ao que
o mercado de trabalho possa usufruir desses profissionais. Vendo por essa
ótica, fica claro o esquecimento da pesquisa científica, sustentáculo para o
desenvolvimento das instituições de ensino e consequentemente do aprimoramento
profissional.
REFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CONSELHO REGIOAL DE ENFERMAGEM/RIO DE JANEIRO.
História da Enfermagem no Brasil. Rio de Janeiro, jul. 2005. Disponível em: http://www.medicinaintensiva.com.br/enfermagem-historia.htm
Acesso em 20 set 2007.
CONSELHO REGIOAL DE ENFERMAGEM/SÃO PAULO.
Desenvolvimento da Educação em Enfermagem no Brasil (Século XIX). São Paulo,
jul. 2005. Disponível em: http://corensp.org.br/072005/ Acesso em 20 set.
2007.
FERNANDES, Josicélia Dumêt; XAVIER, Iara de Moraes;
CERIBELLI, Maria Isabel Pedreira de Freitas; BIANCO, Maria Helena Cappo; MAEDA,
Dirce; RODRIGUES, Michele V. de C. "Diretrizes curriculares e estratégias
para implantação de uma nova proposta pedagógica." In: Revista Escola
de Enfermagem USP: v. 39(4): 443-449, 2005.
ITO, Elaine Emi; PERES, Ainda Maris; TAKAHASHI,
Regina Toshie; LEITE, Maria Madalena Januário. "O ensino de enfermagem e
as diretrizes curriculares nacionais: utopia x realidade". In: Revista
Escola de Enfermagem USP: v. 40 (4): 570-575, 2006
LIMA, Maria José. O que é enfermagem. São
Paulo: Ed. Brasiliense, 1993.
SCANDIAN, Maria; LIMA, Wilma Resende; RÊGO, Rita
Maria Viana; SANTANA, Gleidselma Viana; FEITOSA, Maria Auxiliadora Resende.
Histórico do Curso de Enfermagem. In: ROLLEMBERG, Maria Stella Tavares; SANTOS,
Lenalda Andrade. UFS: História dos Cursos de Graduação. São Cristóvão:
UFS, 1999. p. 261-276.
Autor: Joanita Corrêa da Silva
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